quarta-feira, março 21, 2007

Um Dia de Poesia

Há palavras que nos beijam
Como se tivessem boca.
Palavras de amor, de esperança,
De imenso amor, de esperança louca.
Palavras nuas que beijas
Quando a noite perde o rosto;
Palavras que se recusam
Aos muros do teu desgosto.
De repentes coloridas
Entre palavras sem cor,
Esperadas inesperadas
Como a poesia ou o amor.
(O nome de quem se ama
Letra a letra revelado
No mármore distraído
no papel abandonado)
Palavras que nos transportam
Aonde a noite é mais forte,
Ao silêncio dos amantes
Abraçados contra a morte.
De Alexandre O'Neill
No Reino da Dinamarca 1958

quinta-feira, março 15, 2007

Vergonha

Segundo o “Correio da Manhã” o aborto clandestino deixa de ser punido. Ou seja, se for realizado após as dez semanas ou fora das restantes condições definidas na pergunta do referendo. É, segundo o jornal, o que preconiza o anteprojecto da nova lei de política criminal.

Em face desta situação, pergunto: Para que se fez o referendo? Para que se submeteu ao TC o texto da pergunta do referendo? Era tudo uma mentira? Foi então, por isso, que o Governo e o PS não publicaram qualquer texto sobre o novo quadro legislativo pós-referendo?

Como vão sustentar-se aqueles que, de boa fé, pretendiam a vitória do SIM para acabar com a prisão das mulheres? E aqueles que negavam, de boa fé, aos apoiantes do NÃO as suas ideias quanto à não execução das penas em caso de aborto fora do quadro legal? E aqueles, apoiantes do SIM, que, de boa fé, tanto criticaram o Prof. Marcelo, por este ser favorável a que nunca houvesse punição do aborto fosse este realizado na primeira semana ou na última?

Foram todos enganados! Por um Governo e uma maioria que desmereceram o apoio que lhes foi dado por muitos portugueses.

Não tenho ideia de tamanha vergonha política! E das vergonhas que se seguirão para justificar tal procedimento. Vindas do Governo, da maioria PS e dos que, por fanatismo político, são capazes de vergar a coluna.

segunda-feira, março 05, 2007

Páginas Negras

No Expresso desta semana as páginas 26 e 27 do seu caderno principal, deram-me consciência da minha ignorância. Sob o título “Abandonados no Hospital” o que aí se relata ultrapassa o que eu poderia imaginar em relação ao sofrimento de crianças. Sofrimento físico. Sofrimento psicológico. Sofrimento social.

Estima-se em mais de 200 por ano, as crianças que ficam abandonadas em hospitais, por períodos superiores a um mês. Porquê? Falta de condições de acolhimento pela família biológica. Antecedentes de negligência familiar. Puro abandono pela família. Mas a pior de todas, por serem portadoras de uma deficiência, não tendo um Estado que lhes assegure uma instituição capaz para as acolher. Nestes casos, a criança ou adolescente pode ter uma estadia superior a um ano. Com as visitas familiares a espaçaram-se mais e mais, até desaparecerem. No convívio com as doenças. Com os vários vírus que nos hospitais abundam. Diminuindo as suas condições de recuperação, por falta de uma assistência dirigida ao seu problema. Em alguns casos, depois de passarem por um hospital, irmãos são separadas por falta de condições do centro de acolhimento de uma, para receber a outra, deficiente.

E, como se tudo não bastasse, num país - Itália - com legislação que permite o aborto legal, dentro do prazo de 12 semanas, são abandonados bebés no serviço de urgência de um hospital, o qual - felizmente - tem preparada uma cabina na entrada para o efeito.

De novo, reafirmando o que disse no post anterior, é urgente que se definam prioridades e se planeie a actuação que permita acabar com estas páginas negras.

Páginas negras que iluminam as zonas sombrias que, tantas vezes, teimam em nos impedir de ver a realidade.

sábado, março 03, 2007

Alzheimer, Velhice, Prioridades, Planeamento

A propósito do suicídio de um cidadão português, na sequência do seu acto tresloucado de assassínio da própria mulher, conforme relato no blog Murcon, uma vez mais, atribuo à ausência de planeamento - público e privado, do estado e empresarial - uma das mais sérias limitações ao desenvolvimento em e de Portugal .

Somos um país sem uma adequada definição de prioridades. Porque falta planeamento. Se tivéssemos uma lista exaustiva de tarefas, nas várias áreas de governo, seria possível escaloná-las e, sabendo-se da impossibilidade de as realizar todas ao mesmo tempo, seria exequível a sua ordenação por prioridade. Planear a sua realização e a definição dos recursos necessários. Muitas vezes, pela forma como as decisões vão sendo tomadas, parece que se delibera casuisticamente. De acordo com a sugestão do primeiro que abriu a porta do gabinete do primeiro ministro (este ou qualquer outro).

aqui referi, há largos meses, a obscenidade que representa o apoio do estado à colocação de bandas gástricas. Quando o estado não tem condições de realizar a cirurgia (parece que a lista de espera é de 7 anos), o doente (em muitos dos casos a palavra deveria estar entre aspas) pode recorrer a clínicas privadas. Ao que se dizia na altura o custo era de 8 500 € por intervenção.

Entretanto, os 46 mil doentes de Alzheimer sem qualquer tipo de assistência (dos 70 mil existentes em Portugal) - conforme foi publicado no
Murcon (2006/05/16) -, continuam a não ter as condições de acompanhamento necessárias. Aqueles que por necessidade contactam, ao longo deste país, as entidades oficiais, identificam uma enorme ausência de instalações para acolher este tipo de doentes.

E, se é verdade que durante um certo período os familiares que tratam deste tipo de doentes, procuram encarregar-se dessa tarefa a sós, há muitos que, depois de dias e noites sem descanso, soçobram. São esses que desesperam quando não encontram vagas nas poucas portas que encontram abertas. Resta-lhes o seu próprio bolso (se ainda lá tiverem alguma coisa) para encontrarem (o que nem assim é fácil), o lar pago e nem sempre em razoáveis condições, ou o apoio domiciliário pago utilizado de forma intermitente, para que nos intervalos se possam recuperar as forças.

Sabe-se que um dos melhores negócios de hoje e do futuro é o que se liga à velhice. Como é habitual, o estado alheia-se da análise das causas que propiciam o negócio. Se o fizesse, saberia para onde deveriam ir as suas prioridades. E planearia a intervenção.